O bosque começa na larga avenida, continua pelo sul e vai para os confins de Judas. Há muitas entradas, poucas saídas, todas convergem ao redor de duas cidadezinhas.Tem mil hectares, é artifical, isto é, artesanal. Durante os anos trinta do século passado, os de crise, foram os trabalhadores desempregados que cultivaram a terra e os campos. Logo depois do o portão principal, no fim da avenida, estão as casas dos zeladores, a hípica, o lago. Depois, vê-se um caminho sinuoso que se bifurca; um vai para uma senda que acompanha o rio, o outro, para dentro do mato, levando para outras trilhas. Coelhos e esquilos correm mais ou menos à vontade, perseguidos pelos meninos; patos, marrecos, todos convivendo harmoniosamente à beira da lagoa. A vegetação é variada, algumas plantas são raras e recebem proteção ambiental.
No verão, a cena é de piqueniques, jogos de bola, passeios de bicicleta, de barco à cavalo. Até o canto de rouxinóis se pode escutar. Em noites de lua cheia, é a vez dos namoros nos bancos e nos recantos afastados. Nesta época do ano, é um espaço aberto, bonito, acolhedor. Porém, no inverno, a paisagem muda totalmente. Agora, que o aquecimento global está confiscando as estações do país, e a Branca de Neve foi sequestrada, a cor local é cinza chumbo. A luz desaparece às quatro e meia da tarde, O ambiente é particularmente hostil e abandonado, como ficou de repente, o de João e Maria. É só atravessar uma ponte, pegar aquele caminho desolado, habitado por casuarinas densas e escuras, e dar com a casa pequena e antiga onde ninguém parece mais viver. Este cenário foi todo calculado e previsto, não é bem um cenário de bruxas nem de duendes. Por outro lado, tem seus mistérios, veredas, estórias. No início do ano, deram uma enorme busca por lá. Puseram cães, patrulhas especiais, paranormais especializados em telecinese, isto é, gente que encontra coisas ou pessoas escondidas com o uso de uma vara ou um pêndulo, foram convocados. O país todo acompanhou aflito, as buscas diurnas e noturnas feitas por patrulhas e grupos especiais da polícia, mas nada encontraram. Hoje, logo hoje, aqui na encruzilhada depois da ponte de ferro que cruza o rio, pertinho da casa de João e Maria, o latido insistente da matilha ressoa. Seu lobo esteve por aqui. Um gorrinho de lã e uma botinha de borracha atirados num charco, apareceram. Tudo indica que encontraram o que queriam aqui nesta curva do bosque de Amsterdã. Sedutor e perverso, como todos.
9 Comments
Muito interessante como você consegue contar uma história praticamente só com descrições… e o que era luminoso, de repente desemboca em escuridão e tragédia de uma forma muito delicada. Grande sacada a costura com personagens de histórias infantis.
Impressionante como começa ensolarado e termina numa escuridão surpreendente. Como a passagem abrupta do dia para noite, como num eclipse.
Conheço os caminhos deste bosque e continuo ali passeando enquanto o seu lobo não vem! Belo texto!