Observar como estou resistindo ao outro e a mim mesmo, como lido com o fora e com o dentro. Perceber o quanto estou reagindo e como estou sempre em relação a alguma outra coisa diferente de mim mesmo. Considerar a experiência das associações dos conteúdos que circulam em volta de vários núcleos, em volta dos mais diferentes “eus”.
Refletir. O que estou escolhendo? A que deus dentro de mim estou atendendo? O que tiro da frente para não atrapalhar? O que acolho e o que desacato? A que devo atentar? O que devo velar? O que outro está preferindo? A quem o outro está escutando? Entender que as energias entre o eu e o outro quase sempre surgem frouxamente ligadas. Meditar sobre esse jogo de indeterminações de intensidades variadas que estão quase sempre em contradição.
Aprender que este navegar nem sempre terá os ventos a favor. Aceitar que uns são tufões, que encrespam o mar e aumentam o tamanho das ondas e elevam o nível das águas, e que alguns outros, ao contrário, sopram como uma brisa que acaricia e refresca. Ter a certeza que nunca estaremos certos do exato rumo a ser tomado. Reconhecer que estamos sem bússola a nos nortear, mas lembrar de que é preciso partir, que não há como parar.
Admitir que, de fato, permanece o medo do que não reconheço. Ver que nem sempre saberei exatamente aonde vou chegar já que o grande fosso entre as causas e as consequências de tudo o que faço inviabiliza o saber exato do que acolher e do que ignorar.
Mas mesmo assim confiar, acreditar enfim que é preciso caminhar, se deslocar na direção daquilo que, muitas vezes, parece ser inicialmente uma total abstração, uma completa escuridão, compreender que a harmonia surgirá com o movimento, assim como na música, surgirá exatamente deste combate de tensões. Alcançar, por fim, que naufragar é não partir.
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O texto me fez refletir sobre como o desequilíbrio (a falta de controle) é necessário ao mesmo tempo em que o equilíbrio (controle) também. Parece que sempre estamos nos equilibrando entre esses dois pólos – "admitir o medo", isto é controlá-lo, e "permanece o medo", a zona de desequilíbrio.
Muitas indagações, questionamentos e por fim a conclusão, o reconhecimento da precariedade das respostas "…enfim que é preciso caminhar, se deslocar na direção daquilo que, muitas vezes, parece ser inicialmente uma total abstração, uma completa escuridão". Bela sacada.
Angela você (sempre) navegando, indagando, questionando, buscando, sugerindo, sempre vai longe…bem longe. Gosto!
M.Júlia