
Ela acordou inquieta!
Balançando na rede pensou na vida,
e teve saudade da avó.
Não daquela avó de fé servil, obediente.
Mas da outra, doidivana entre costuras e carinhos,
que via em um café com bolo,
ou em qualquer belezura da vida
um altar para agradecer o bem viver.
Ainda na rede teve vontade de beijo.
Não de beijos planejados, relativizados
por grandes amores ou ardentes paixões
Não!
Nesses ela nunca acreditou.
Queria um beijo doce, simples,
Dado por quem sempre vai voltar.
No fundo da rede sentiu preguiça, sentiu desejo.
Vontade danada de deitar
com as pessoas nos prados das rosas de Guimarães.
Vontade de dançar com Manoel e Clarice,
abraçar Fernando, José e Jorge Luiz
e visitar Adélia.
E de repente, quase sem querer, olhou a lua
redonda e gigante na janela do quarto.
Lembrou de estrelas,
daquelas da sua infância, companheiras da sua solidão,
e as da sua juventude
materializadas em espectros por uma equação
E teve fé.
Fé nessas estrelas que vêm de muito longe, de muito antes.
Fé na sua luz, nas suas cores
Ora intensas como no céu do Rhône,
Ora vagas, como as da Ursa maior.
6 Comments
Que belo texto conectando as memórias, as pessoas queridas, o eu e as estrelas. Seres de luz, cores, intensidade e indeterminação.
Adorei as referências ao cinema e à pintura!
A vida é cheia de milagres. Milagres banais, considerando-se os sacralizados por costumes e tradições. Temos sorte de encontrar pelo caminho pessoas que nos pegam pela mão e nos mostram a beleza dos acontecimentos e dos gestos simples. É o que nos revela esse poema, que parece feito na medida para se repousar da fadiga e beber a água fresca oferecida pela poeta.
Fé poética, generosa.Fé nas luzes, cores, estrelas. Fé visual. Muito singela e linda!
Luzes, cores, beleza nesta fé tão bonita, singela e visual Dora!
Memórias e fé nas estrelas… há quem diga que nossos entes queridos estão lá. Há fé nisso. Gostaria de ter a fé de que minha saudosa vó está lá entre as estrelas.