“Todas as fantasias se encontram na natureza. Criando os homens, ela fez o gosto de cada um tão diverso quanto o rosto”.
(Marquês de Sade)
Angélica não parecia andar. Flutuava. Seus pés batiam de leve o chão e faziam um barulho, toc toc toc toc, como se marcassem o compasso do coração. O dia estava nascendo e ipês roxos enchiam de buquês a calçada. Uma brisa fresca acariciava a penugem fina do braço, prolongando na pele a sensação vivida entre lençóis de seda por toda a madrugada.
A noite havia começado na boate “La Petite Chatte” por sugestão do namorado, que pediu de presente uma ménage à trois, especialidade da casa. O pedido fez Angélica reagir com desconfiança ao pensar que Leonardo se interessaria mais pela convidada do que por ela, lhe reservando o papel de voyeur. Um frisson a tomou ao imaginar uma participação diferente naquela experiência ousada.
Após algumas danças e flertes na boate, uma gata, cabelos coloridos, foi a escolhida.
Já no quarto, a mulher chamada Leila tranquilizou Angélica dizendo que não precisaria ter ciúmes e que aproveitasse o momento. Tudo aconteceria da maneira combinada pelos três. Finalizado o contato prévio, Leila estabeleceu as condições. Sexo oral e masturbação, sim; penetração não, e foi se trocar. Os namorados, um pouco aturdidos pela abordagem didática e direta da moça, também saíram para mudar de roupa.
Passados alguns minutos, Leonardo, mal se aguentando, colocou uma música e preparou um drink, bebido de uma só vez. Felizmente, para ele, sua namorada apareceu. Portava um conjunto de calcinha e sutiã combinados, gestos contidos e um sorriso mal esboçado. Leila fez sua entrada. Vestia lingerie preta de renda, meias finas e escarpins pretos, que se movimentavam conforme o serpentear de pernas lisas e bem torneadas.
Devagar, mexendo-se num balé ensaiado como espontâneo, pegou cada um pelas mãos, trouxe-os para junto do corpo e distribuiu carícias. Solta, a dançarina enfiou a língua na boca de Angélica e segurou firme o pau de Leonardo, que saltou livre a desejar a umidade de bocas e grutas. Alucinado, Leo suplicou por beijinhos e foi correspondido. Uma lambendo, outra chupando, gozou.
Enquanto Leonardo se recuperava, Leila levou Angélica para a cama, dando-lhe beijos no pescoço, nos seios e na barriga. Já no leito, abriu-lhe as pernas para tratar como pétalas os grandes lábios, os quais lambeu em círculos tão leves como a pluma. Em seguida, dedos delicados começaram a passear por dentro do corpo, num vai e vem constante, ao mesmo tempo que lambidas quentes e molhadas perambulavam pela entrada. Angélica se contorcia. Leila puxou-lhes os cabelos para traz e caiu sobre os seios macios, chupando cada um dos mamilos à medida que aumentava a velocidade dos dedos entre relevos e fendas. Angélica só conseguia dizer baixinho, Vou morrer, Vou morrer, e explodiu em lágrimas, em um êxtase jamais experimentado.
Ainda deitada, Angélica virou-se de lado. Procurava Leonardo, de quem somente se lembrou naquele instante. Sua face, que resplandecia prazer e alegria, crispou-se ao encontrar olhos raivosos que percorriam os corpos nus e abandonados lado a lado.
Descoberto, Leonardo baixou a cabeça e, andando pra lá e pra cá, recolheu as roupas espalhadas pelo chão. Ao tropeçar nas próprias calças, parou e olhou para o alto como a procurar um ponto no teto. Em silêncio dirigiu-se a porta e, antes de abri-la, voltou-se para Angélica, Bem que percebi que odiava homens!, Não, não odeio não! Só não quero mais um na minha cama, respondeu Angélica antes de beijar Leila terna e longamente.
10 Comments
Lindo texto,querida!
O leitor fica "preso" pelas belas imagens descortinadas como se estivesse sentado na poltrona de uma sala de cinema!
Lili parabéns pelo lindo texto, uma leitura fácil e muito interessante com riqueza de detalhes que prendem a atenção do leitor…mais uma vez parabéns!!!!!
Não devia haver receio nenhum! Muito bacana finalmente essa temática entrar na Roda. Pra além da sensualidade do texto, acho que li perfeitamente seu viés político, os estereótipos de gênero esbofeteados pelo desfecho. Adorei!
Vaneska
Uau! Texto surpreendente do começo ao fim, muito bem escrito, prende o leitor! Conteúdo atual muito bem narrado nos seus pequenos detalhes. Parabéns!
Eliana, você sempre versátil, com uns finais repentinos e inesperados, surprendeu!
M.Júlia
Muito bem-sucedida na intenção, menina! Parabéns!
Já me disseram que um final aberto seria mais interessante. Mas o texto tem uma pegada "política", embora possa servir como diversão. De certa forma defende um amor livre do peso da tradição e do preconceito e que possa fluir sem a solidez do controle de corpos, principalmente o feminino.
Texto puramente pós-moderno. Disse e repito: adorei o final. Direto e objetivo como as relações desse mundo líquido moderno. Parabéns!
Obrigada, Mônica. Estava com um pouco de receio da acolhida. Minha intensão com esse conto foi continuar a explorar as singularidades do universo feminino, agora com o sexo.
Eliana
Maravilhoso texto! E que desfecho genial!